segunda-feira, outubro 09, 2006

Destiny.. Contador das histórias que são, foram e serão...

- Ele vê as coisas como são, foram e serão. E foi o senhor das coisas que não foram e jamais serão. Destino é uma divindade cega, inexorável nascido da Noite e do Caos...
Pequenas risadas podem ser ouvidas e uma pequena voz que parecia temerosa, mas determinada, puxa então parte do tecido de sua calça.
- Destino é cego como você, Aengus?
- Shhhhh!! Deixa ele continuar...
Vinham as outras vozes infantes que estavam sentadas ao redor de Aengus com seus olhos brilhantes, vendo aquele homem de olhos acinzentados, quase azulados, que carregava sempre com ele um livro dentro da bolsa a tiracolo. Aengus permanecia com os dedos dele sobre o livro, com um sorriso aos lábios, quase podendo ver as crianças impacientes e ansiosas, abraçadas às suas pernas, observando o homem cego, com pesado casaco marrom que o protegia. As crianças pareciam se divertir toda vez que ele aparecia a andar pelo parque, conduzido por sua bengala. Tão certo em seus passos, como se pudesse enxergar. Mas ao que o questionavam, as cores de seus cabelos, de suas roupas ou a cor do que estavam comendo. Aengus sempre os deixavam em mais dúvidas do que já se encontravam, dando sempre respostas dúbias para as pequenas cabecinhas pensantes que muito iriam trilhar em suas vidas.
- Continue!! Continue!!
Vinha o pequeno coral, esperando os dizeres daquele homem que parecia tão sábio e que tinha a voz como o farfalhar de velhos pergaminhos numa biblioteca tarde da noite. Quando as pessoas já tinham ido para casa e os livros começavam a ler a si mesmos. Assim como Aengus diria a eles. A mão dele encontrava os cabelos anelados da criança que estava a puxar-lhe parte da calça e por um momento afagava os cabelos, voltando a ler para as crianças que sempre buscavam conselho ou histórias com ele.
- Todas as outras divindades estavam submetidas ao seu poder. Os céus, a terra, o mar e os infernos faziam parte do seu império. O que resolvia era irrevogável. Em resumo, o Destino era por si mesmo essa fatalidade, segundo a qual tudo acontecia no mundo.
Os olhos se arregalavam e pequenos burburinhos se faziam, tentando não atrapalhar Aengus em seu desenrolar do conto que falava sobre Destino.
- Júpiter, o mais poderoso dos deuses, não pôde aplacar o Destino nem a favor dos outros deuses, nem a favor dos homens.
A voz mais uma vez exaltada parecia surpresa, pois Júpiter era um deus conhecido nas lendas das lições de casa ou até mesmo da mitologia romana onde era o Pai dos Deuses.
- Mas... Mas.. Ele é o pai de todos os deuses. Como? Como ele não pôde aplacar Destino?
Mais uma vez Aengus afagava os cabelos anelados daquela criança, enquanto a outra mão passeava pelo livro que parecia tão bem escrito.
- As leis do Destino eram escritas desde o princípio da criação em um lugar onde os deuses podiam consultá-las. Os seus ministros eram as três Parcas encarregadas de executar as ordens. Representam-no tendo sob os pés o globo terrestre, e agarrando nas estrelas, e um cetro, símbolo do seu poder soberano.
Mais uma interrupção e muitos Shhhhs! Pedindo silêncio, arrancam mais um sorriso nos lábios de Aengus. Seus olhos não pousavam sobre aquele livro, apenas seus dedos passeavam sobre as linhas tão bem escritas. Finos traçados espirais das galáxias no vazio, onde ele sentia os intricados padrões da vida em sua jornada através do tempo.
- Para mostrar que era inflexível, os antigos o representavam por uma roda que prende uma cadeia. No alto da roda uma grande pedra, e embaixo duas cornucópias com pontas de azagaia. Conta Homero que o Destino de Aquiles e de Heitor é pesado na balança de Júpiter, e como a sorte do último o arrebata, sua morte é decretada, e Apolo retira o apoio que lhe dispensara até então. São as leis cegas do Destino que tornaram culpados a tantos mortais, apesar do seu desejo de permanecerem virtuosos: em Ésquilo, por exemplo, Agamemnom, Clitemnestre, Jocasta, Édipo, Eteoclo, Polínice, etc... etc... etc... Que não podem fugir à sua sorte.
Vozes adultas gritam chamando as crianças, em certo ponto aliviadas por aquele estranho ter aparecido naquele parque. Muitos pais podiam estranhar ou ficarem arredios, mas a calma e a paz que aquele homem passava às crianças que pareciam tão atentas as suas histórias que falavam sobre lendas e as conseqüências dos caminhos escolhidos, tornaram Aengus uma babá perfeita para dar um pouco de tranqüilidade aos pais que iam até o parque buscar um pouco de paz. Alguns:
"- Aaaah!!! Já temos que ir?"
Podiam ser escutados e Aengus sorria de forma plácida fechando seu livro guardando-o na bolsa que ele carregava.
- Não sejam arredios, pois muito vocês ainda precisam trilhar para que seus próprios passos possam dar sem a devida proteção de seus pais, ou as mãos que os reerguerão quando caírem nas trilhas incertas.
Uma algazarra é feita e muitos adeus são dados, mas ali mesmo Aengus os corrigia.
- O Adeus é uma palavra longa demais para ser dita. Até breve é o que espero e hei de esperar.
Corriam as crianças para seus pais, gritando até breve para Aengus. Seus olhos cegos baixam-se então para o livro já guardado, onde novas linhas estavam sendo escritas em seu livro. Com calma acaricia aquela capa feita em couro e tão velho como o próprio tempo ou até mesmo Destino, deixando um breve murmurar escapar daqueles lábios que agora pareciam tão sérios.
- Só os oráculos podiam entrever e revelar o que estava escrito no livro do Destino. Aonde várias trilhas por onde ele poderia seguir, surgiam. Mas, sempre haveria apenas uma por onde ele veio e seguirá, pois o que passou, passou, e não há mais como retornar.
O sol tornava-se cada vez mais fraco e os passos de Aengus seguiam sob as sombras das árvores daquele parque que estava tão vivo com a presença das pessoas e que agora ficava cada vez mais frio e silencioso.
- Muitas lágrimas serão derramadas em breve, e nem mesmo os risos de hoje conseguirão aplacar a dor que virá, minha irmã...

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